Vinte trabalhadores em condições análogas a de
escravos foram libertados de uma lavoura de café, a aproximadamente 35
quilômetros de Caratinga, no Leste de Minas Gerais, na manhã desta quarta-feira
(28). Uma denúncia dos próprios trabalhadores levaram os fiscais do Ministério
do Trabalho até a fazenda onde havia a lavoura de café. Um ônibus esteve no
local e levou os trabalhadores para Caratinga.
Os trabalhadores estavam no local há 14 dias. Eles
são da cidade de Jenipapo de Minas, no Vale do Jequitinhonha, a aproximadamente
500 quilômetros de Caratinga. Em um imóvel com cerca de 100m², 16 pessoas
viviam em condições degradantes, entre eles um adolescente de 16 anos. Na
última semana, dois trabalhadores foram até Caratinga e fizeram uma denúncia no
Ministério do Trabalho.
”Dois dos trabalhadores estiveram há cerca de
uma semana em Caratinga e nos informaram das condições, ou melhor, da falta de
condições que encontraram quando chegaram para trabalhar no dia 14 deste mês.
Além disso, nenhum deles tinha registro em carteira. A situação encontrada no
local caracteriza um trabalho degradante pela situação que os trabalhadores
estavam alojados”, explica Carlos Paixão, auditor-fiscal.
O grupo de trabalhadores foi seduzido
por uma proposta de trabalho na lavoura de café que duraria pelo menos até o
mês de setembro. Ao chegar no local eles perceberam aquilo que havia sido
combinado não seria cumprido. Um dos trabalhadores que fez a denúncia no
Ministério do Trabalho é Ângelo Gomes Ribeiro, de 27 anos. Ele disse que tudo
que havia sido acordado não foi cumprido.
“Uma pessoa que seria o representante
do dono da fazenda foi quem combinou com um agente em Jenipapo. Este agente
receberia um percentual nos valores que receberíamos para nos indicar. A nossa
expectativa era de um faturamento diário de até R$ 160, de acordo com aquilo
que havíamos acordado com o agente. Mas quando chegamos recebíamos R$ 30 por
dia e ainda eram descontados R$ 10 da nossa alimentação. Nem a nossa carteira
de trabalho que ele prometeu assinar e ele fez”, afirma Ângelo Ribeiro.
Em outro imóvel, dois casais que
também fazia parte do grupo de trabalhadores enfrentavam os mesmos problemas.
Houveram dias em que os trabalhadores foram impedidos até de comer, diz Ângelo.
“Assim que vimos que as coisas não estavam
sendo cumpridas fomos reclamar com o representante do dono da fazenda. O dono
mesmo é um médico que nunca esteve aqui para falar conosco. Depois que
reclamamos, o representante veio até a casa e trancou os alimentos. Ficamos
dois dias sem comer. Numa destas noites, tivemos que sair do imóvel durante a
madrugada porque a instalação do chuveiro começou a pegar fogo. Fizemos uma
fogueira e ficamos ao relento com medo de um incêndio”, revela Ângelo
Ribeiro.
De volta para casa
Segundo o auditor-fiscal Carlos
Paixão, os trabalhadores serão encaminhados de volta à Jenipapo de Minas na
noite desta quinta-feira (29).
“Eles foram retirados da fazenda e serão
encaminhados para a cidade deles. O dono da fazenda já está ciente da
ocorrência e já foi feito um acordo com o advogado dele. Nesta quinta-feira
será feito o pagamento destes trabalhadores, ele vão receber tudo o que têm
direito, verbas rescisórias, seguro-desemprego e terão as suas carteiras
assinadas até o mês de setembro. Por volta das 23h, eles embarcam em um ônibus
até Itaobim, embarcam em outro para Araçuaí e em seguida serão levados para
Jenipapo”, diz Carlos Paixão.
Alívio
Nelson Moreira de Caldas, de 29 anos,
é casado e tem uma filha. Ele é um dos trabalhadores resgatados e diz que não
vê a hora de rever os seus familiares. “Foi um alívio para todos nós. Nunca passamos
por uma situação humilhante como esta. Foi um abuso o que fizeram com a gente.
O que a gente mais quer agora é voltar para casa e rever os nossos familiares”,
diz Nelson.
O auditor-fiscal fez um relatório que
será encaminhado ao Ministério Público do Trabalho e Federal. “Além
disso, serão feitos Autos de Infrações que posteriormente se transformarão em
multas. Não é possível falar o valor destas multas porque cada infração vai
gerar um valor. Inclusive a infração de ter um menor trabalhando no local e
pelo aliciamento de mão de obra”, explica Carlos Paixão.
Defesa do fazendeiro
O proprietário da propriedade informou
que estava em viagem. Em nota, os advogados responsáveis pela causa
esclareceram que o proprietário foi procurado pelos trabalhadores e ele
ofereceu o serviço pelo valor de R$ 15,00 o balaio, sendo que, na região, o
preço médio é de R$ 10,00.
Ainda conforme exposto em nota, os
trabalhadores apareceram na fazenda sem prévio ajuste da data de chegada,
exigindo-lhe preço muito superior ao oferecido e ao praticado na região,
inviabilizando a prestação dos serviços e desconsiderando a proposta que fora
feita originalmente ao proprietário.
Diante desse desacordo, com os trabalhadores
pedindo o dobro do valor pago na região, o proprietário não quis a prestação de
serviços. Os trabalhadores, então, ingressaram na fazenda, instalando-se em
casas de colonos existentes no local e se recusaram a sair, tendo se
desentendido, também, com seus representantes e não tinham a intenção de
voltar, manifestando o desejado em continuar na região em busca de trabalho em
outras lavouras.
Os advogados afirmam ainda que em
nenhum momento, houve qualquer tipo de prestação de serviços. Salientando ainda
que o Ministério do Trabalho, em sua ação, colheu os depoimentos e interpretou
a questão do ponto de vista único da narrativa dos trabalhadores. O
proprietário, no entanto, atendeu a todas as exigências do Ministério do
Trabalho e, por zelo, aguarda os desdobramentos para se defender administrativa
e judicialmente, inclusive, para prestar maiores esclarecimentos à imprensa.
Leia na íntegra a nota de esclarecimento dos
advogados, que representam o proprietário da fazenda:
NOTA DE ESCLARECIMENTO À IMPRENSA.
Com respeito à matéria veiculada por este meio de comunicação, relativa
à ação do Ministério do Trabalho e Emprego em fazenda da região, tem o
proprietário, por meio de seus procuradores, a informar o seguinte. Que foi
procurado por pessoas que se disseram representantes dos trabalhadores
perguntando se ele tinha interesse na contratação de mão-de-obra para a
colheita do café, como notoriamente ocorre todos os anos em todas as fazendas
da região e com todos os proprietários.
Tais pessoas não tinham nenhum vínculo com o proprietário e apenas o
procuraram por ser ele um produtor de café. Naturalmente, ante a carência de
mão-de-obra nessa época do ano, disse que necessitaria dos serviços, que foi
oferecido por R$ 15,00 o balaio, sendo que, na região, o preço médio é de R$
10,00 o balaio. Os trabalhadores apareceram na fazenda sem prévio ajuste da
data de chegada, exigindo-lhe preço muito superior ao oferecido e ao praticado
na região, inviabilizando a prestação dos serviços e desconsiderando a proposta
que fora feita originalmente ao proprietário.
Diante desse desacordo, com os trabalhadores pedindo o dobro do valor
pago na região, o proprietário não quis a prestação de serviços. Os
trabalhadores, então, ingressaram na fazenda, instalando-se em casas de colonos
existentes no local e se recusaram a sair, tendo se desentendido, também, com
seus representantes. Desde esse dia, veio o proprietário tentando por todos os
meios a composição amigável para que deixassem o local, oferecendo-lhes,
inclusive, para custear o retorno. Os trabalhadores disseram que não tinham
intenção de voltar e que queriam continuar na região em busca de trabalho em
outras lavouras.
Portanto, os trabalhadores só ficaram instalados na fazendo por
iniciativa deles próprios, pois se recusaram a deixar a propriedade, mesmo sem
ter trabalhado nenhum dia sequer. Quanto à alegação de condições degradantes,
reafirma-se que não houve trabalho e que o proprietário tentou de todas as
formas retirar os trabalhadores do local e custear seu retorno à origem, mas
estes insistiram em não sair da fazenda.
Fato é que, em nenhum momento, houve qualquer tipo de prestação de
serviços, não tendo os trabalhadores colhido um único grão de café. O
Ministério do Trabalho, em sua ação, colheu os depoimentos e interpretou a
questão do ponto de vista único da narrativa dos trabalhadores.
O proprietário, no entanto, atendeu a todas as exigências do Ministério
do Trabalho e, por zelo, aguarda os desdobramentos para se defender
administrativa e judicialmente, inclusive, para prestar maiores esclarecimentos
à imprensa.
Atenciosamente,
Sérgio Gonçalves Horsts e Ivan Barbosa Martins
(Advogados)
FONTE: Inter TV/ Super
Canal, via Aconteceu no Vale.