Nos últimos dois anos, a redução drástica da incidência de chuvas levou
o Sudeste brasileiro a conviver com secas consideradas as mais severas dos
últimos 100 anos, conforme relatório de conjuntura da Agência Nacional de Águas
(ANA). Desde outubro de 2013, os índices pluviométricos reduziram a níveis
baixíssimos, chegando a registrar, em alguns períodos, até 1% da quantidade
esperada.
Minas Gerais, o Estado que ainda se orgulha do título de caixa d´água do Brasil, só conhecia a escassez na parte mineira do polígono da seca, mas agora se surpreende com a crise hídrica também na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH). Para avaliar a situação do País e do Estado, a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) promove o Seminário Legislativo Águas de Minas III – Os Desafios da Crise Hídrica e a Construção da Sustentabilidade, cuja etapa final será realizada de 29 de setembro a 2 de outubro. “Nosso objetivo é criar um marco regulatório para que haja um planejamento mais elaborado da gestão das águas”, afirma o presidente da Comissão Extraordinária das Águas, deputado Iran Barbosa (PMDB).
Recurso escasso exige atenção
O fato é que o fenômeno natural da redução de chuvas não pode ser
considerado o único responsável pela atual crise hídrica. O assunto é controverso
e reabre chagas negligenciadas por gestores e governos sucessivos, alimentando
o debate sobre as múltiplas causas e as consequências do problema.
Especialistas explicam que a água disponível no planeta é a mesma desde sua
formação, mas com o aumento da população, diminui cada vez mais a porção que
pode ser dividida para cada habitante. A poluição dos mananciais dificulta
ainda mais a disponibilidade de água potável.
Má distribuição dos mananciais dificulta o acesso à
água
O desafio da falta d´água já começa na distribuição desse recurso no
território nacional. O Brasil detém cerca de 16% de toda água doce disponível
no planeta, mas apenas 0,7% é utilizado, em função das diferenças de
ocorrência. A região Norte, onde está cerca de 7% da população, detém 68% de
todos os recursos hídricos; enquanto o Sudeste, que concentra 42% dos
brasileiros, possui somente 6% dos mananciais.
A pressão demográfica torna-se, então, outro fator que explica a
dificuldade de atender à demanda, que cresce junto com a população, o avanço
tecnológico e o desenvolvimento industrial.
O Atlas Brasil, editado pela ANA em 2010, aponta que a retirada de água
da natureza triplicou nos últimos 50 anos. Se todas as pessoas consumissem o
mesmo nível que os europeus e os americanos, seriam necessários 3,5 planetas
para atender a necessidade. De acordo com o documento, uma criança de país rico
consome entre 30 e 50 vezes mais água que uma criança de um país pobre. A
previsão é de que, até 2030, 47% da população mundial viverá com grande
escassez de água.
A ameaça que vem do céu
Estudiosos de climatologia advertem para mudanças ainda mais profundas
que já estão em processamento no planeta e inevitavelmente vão alterar a
realidade hoje conhecida. O Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas (PBMC), um
comitê que reúne especialistas do País no assunto, fez algumas projeções, com
diferentes graus de confiabilidade.
De acordo com esses estudos, a Amazônia deve ter uma redução de 10% no
índice de chuvas já nos próximos cinco anos. A previsão é de que a temperatura
se eleve entre 5ºC e 6ºC e a precipitação pluviométrica (ocorrência de chuva)
tenha uma queda entre 40% e 45% até o final do século. O semiárido do Nordeste,
já tão castigado pela seca, também deve sofrer um aumento de temperatura entre
3,5°C e 4,5°C e uma queda de 40% a 50% nos índices de chuvas. Já a região Sul,
embora também vá registrar entre 2,5°C e 3°C de mais calor terá entre 35% e 40%
a mais de chuvas, aumentando o risco de alagamentos.
As projeções para o Sudeste não foram consideradas muito confiáveis pelo
PBMC, mas apontam para um aumento entre 2,5°C e 3°C na temperatura e de 25% a
30% também de crescimento na pluviosidade. Em Minas Gerais, o risco já é
iminente. A continuar a falta de chuva este ano, o próprio Igam prevê esgotamento
da capacidade de abastecimento dos sistemas Rio Manso, Serra Azul e Vargem das
Flores até novembro, quando os reservatórios responsáveis pelo abastecimento da
RMBH atingirão níveis baixíssimos.
FONTE: ALMG, por Luciene Ferreira.